Nos dias 13 e 14 de agosto, quinta e sexta-feira, a Sala Funarte Sidney Miller recebeu o show Clube da Encruza, formado pelos integrantes do Metá Metá e do Passo Torto – incluídos entre os destaques da música brasileira contemporânea. A apresentação fez parte do projeto Contemporâneos na Sala Funarte.
A cantora e percussionista Juçara Marçal e o saxofonista Thiago França integram Metá Metá, juntamente com Kiko Dinucci (guitarra e voz) – que também compõe o Passo Torto. Neste grupo, o músico toca ao lado de Rodrigo Campos (também guitarra e voz) e Marcelo Cabral (baixo elétrico e acústico) e Romulo Fróes (voz e violão). O Clube da Encruza conta ainda com o baterista Sérgio Machado, (que também se apresenta com Criolo). Os dois shows encerraram a ocupação do coletivo Audio Rebel/Quintavant, realizada por Bernardo Oliveira e Pedro Azevedo, na nova série da Funarte.
Os shows
Os espetáculos tiveram como proposta traçar um panorama da nova canção paulistana contemporânea e seus desdobramentos. O repertório foi organizado a partir dos álbuns Encarnado, (Queimando a língua, Velho amarelo, A Velha da capa preta), Bahia fanstástica (Ribeirão, Princesa do mar, General geral), Padê, de Kiko Dinucci e Juçara Marçal (São Jorge) Metal Metal (Exu, Oya e São Jorge), Metá Metá (Obá Iná, Logun), Barulho Feio, de Romulo Fróes (Barulho feio, Pra comer, Espera) Sambanzo, de Thiago França (Etiópia), Passo Torto (A Música da mulher morta) e terminou com Opinião, de Zé Kéti, “como que atestando a contundência, a força, a coragem e a determinação deste grupo de artistas de se manter como artista independente”, comenta o Diretor do Centro da Música da Funarte, Marcos Lacerda – e cita os trechos da música: “Pode me prender/ podem me bater/ podem até deixar-me sem comer/ que eu não mudo de opinião”.
“Nesses shows, a sala Funarte abrigou um momento histórico para a música popular brasileira”, avalia Marcos idealizador do Contemporâneos na Sala Funarte. “O Clube da Encruza apresentou uma espetáculo que ficará registrado como um dos grandes acontecimentos da música do Brasil – contemporânea e de todos os tempos”, conclui.
Sobre os artistas
Além de participarem de coletivos renomados, todos os músicos do Clube têm trabalho autoral reconhecido como de excelência: Juçara Marçal lançou, no ano passado, o álbum Encarnado, premiado e celebrado pelo público e pela crítica, que inclui canções de Siba, Kiko Dinucci e Rodrigo Campos, entre outros; Kiko Dinucci lançou, em 2008, Padê – com Juçara Marçal – e, em 2010, Na boca dos outros; Thiago França lançou Sambanzo, em 2012; Rodrigo Campos teve dois álbuns muito celebrados pela crítica: São Matheus não é tão longe (2009) e Bahia Fantástica (2012); já Romulo Fróes lançou Um Labirinto em cada pé (2011) e Barulho feio (2014), entre outros – além de ser crítico musical, com muitos artigos publicados em alguns dos jornais de maior circulação do país.
A ocupação do Audio Rebel/Quintavant – o Contemporâneos na Sala Funarte – a proposta do Centro da Música (Cemus)
Para Marcos Lacerda, esses dois shows – e a ocupação do coletivo Audio Rebel/Quintavant, como um todo – sintetizaram e realizaram perfeitamente o que ele procura em sua gestão, no Cemus/Funarte: a “necessidade urgente de renovação da mediação crítica e curadoria na canção brasileira; a confirmação da consolidação de uma nova estética e política na música e na canção popular feitas no país; e a confirmação do interesse do público para esta nova música (pois os cinco espetáculos estiveram com casa cheia, e os shows do Clube da Encruza, lotados)”.
“A Fundação Nacional de Artes precisa corresponder amplamente às suas atribuições nacionais. Isso tem a ver diretamente com a nossa relação com a música popular feita no Brasil; com a heterogeneidade das formas de se fazer canção; e com a força da nossa música, que atravessa classes, regiões e cidades. A canção feita neste país é, desde a sua gênese, radicalmente cosmopolita, democrática e popular – tanto no âmbito da criação, quando no da recepção (embora, ainda não de todo, no âmbito da crítica). Vivemos, na nossa canção, algumas das experiências mais vitais e realizações mais profundas da sociedade brasileira – como se conseguíssemos produzir o que temos de melhor, sem as intragáveis e inaceitáveis exclusões de todos os tipos: sociais, políticas, educacionais e estéticas”, diz o diretor do Centro da Música da Funarte.
Para Marcos Lacerda, O Clube da Encruza sintetiza a força dessa mensagem universal, igualitária e “radicalmente inventiva da nossa música e canção populares, com um nível de excelência formal e inventividade experimental raro – cuja força pulsional não nega os desafios da representação e da forma”. O diretor fez questão de ressaltar a singularidade dos artistas: “Eles são, hoje, o melhor do melhor da música brasileira contemporânea. O impacto que senti nesses dois shows só é comparável ao da aparição dos Racionais Mcs, especialmente no surgimento do álbum Sobrevivendo no inferno – um dos acontecimentos centrais da nossa música popular em todos os tempos. Aliás, a inteligência cênica, a potência poética, a inventividade sonora, a força musical, o vigor e a complexidade política do Clube da Encruza o aproxima muito mais das experiências de ruptura estética e política da música popular feita no Brasil, do que, necessariamente, com uma certa tradição da nossa canção – uma certa “linhagem” que, no fundo, é só mesmo isso: um caminho possível, entre muitos outros. E o caminho do clube da encruza hoje me parece o mais interessante para a nossa canção e música popular”.
Por fim, Marcos destaca o papel da Funarte, da nova série da Sala Sidney Miller e dos realizadores – o crítico musical Bernardo Oliveira e do produtor Pedro Azevedo, responsáveis pela ocupação Áudio Rebel/Quintavant (julho e início de agosto): “Não é pouco o fato de a Fundação, através do projeto Contemporâneos na sala Funarte, ter abrigado esse momento histórico”, resume o diretor; e afirma não ser possível diminuir o fato de que o evento aconteceu por conta da atuação do coletivo. “O Audio Rebel/Quintavant, vêm fazendo um dos principais trabalhos de curadoria e mediação crítica da música mais inventiva feita hoje no país. A atuação segura e precisa de Pedro Azevedo, e a erudição ímpar e vigorosa de Bernardo Oliveira, responsável pela excelência na escolha dos artistas da ocupação (incluindo, é claro, o Clube da Encruza), representam algo muito especial para o campo cultural do Brasil contemporâneo”, acrescenta.
Marcos Lacerda finaliza com o lembrete de que esta ocupação foi somente o primeiro momento do projeto, que incluirá ainda mais cinco grupos de curadoria até dezembro – além de uma série de lançamentos.
Projeto Contemporâneos na Sala Funarte 2015
Mais informações: cemus@funarte.gov.br