Política Nacional das Artes é presente para o futuro

Presidente da Funarte, Francisco Bosco - Foto: Janine Moraes

Confira abaixo artigo do presidente da Fundação Nacional de Artes – Funarte, Francisco Bosco, publicado nesta quinta-feira na Folha Online:

Se o leitor quiser abrir um equipamento cultural hoje, poderá pagar pelo kilowatt de energia quase duas dezenas de vezes mais do que paga uma fábrica de automóveis. E, ao contratar funcionários, seus encargos trabalhistas chegarão a ser quatro vezes maiores que em setores considerados estratégicos no nosso modelo atual de desenvolvimento.

Se o leitor quiser produzir um festival internacional de artes, sua situação não será melhor. Entre imposto de renda, taxas de importação provisória de equipamentos e outros custos, seus gastos podem chegar a duplicar o valor empregado no cachê dos artistas convidados.

Criar condições econômicas de produção e circulação mais favoráveis é um passo fundamental para ajudar a florescer o sistema das artes no Brasil como um todo. Com efeito, a economia da cultura é percebida pelo MinC (Ministério da Cultura) e a Funarte (Fundação Nacional de Artes) como um campo de atuação decisivo para a Política Nacional das Artes (PNA), cujo processo de construção acaba de ser lançado.

A tendência antropológica do ex-ministro Gilberto Gil deve se desdobrar agora numa tendência econômica, capaz de massagear as cadeias produtivas das artes, vitalizando-as, e com elas sua dimensão simbólica, experiência ampliadora do sentido e dos sentidos, fim primordial da ação.

Mas não único, já que a cultura pode se revelar uma alternativa para a diversificação da economia brasileira, dependente ainda do mercado de commodities e suas variações. Enquanto a ONU (Organização das Nações Unidas) estima que o setor criativo já responde por 7% do PIB mundial, no Brasil o segmento movimenta menos de 3% da economia.

Como observa o ministro Juca Ferreira, “estamos falando de um mercado na mais franca expansão em um mundo em crise, e para o qual ainda não nos organizamos para nele competir”.

É necessário construir indicadores precisos e uma reflexão consistente sobre o assunto, pois isso pode viabilizar finalmente a reivindicação da cultura por ser percebida como um setor estratégico para o país, com orçamento condizente.

Mas há muito mais a formular e implementar no conjunto ambicioso de políticas públicas que se pretende a PNA: estabelecer um pacto federativo para o fomento, articulando as instâncias federal, estadual e municipal, a fim de gerar maior eficiência e aumentar os recursos; reformar a lei Rouanet, no sentido de garantir uma distribuição mais equilibrada dos recursos, incluir possibilidades de linhas de investimento e exigir do empresariado um percentual de contrapartida; discutir e transformar os marcos legais da cultura que regem a gestão pública, desburocratizando e flexibilizando o que for possível; estabelecer uma política clara e continuada para a internacionalização da arte brasileira, entre outros temas.

Isso só será possível se conseguirmos mobilizar artistas, setores artísticos e a sociedade em geral no sentido de impor a política para as artes como uma agenda fundamental no Brasil.

Para tanto, a PNA terá quatro eixos de ação: uma plataforma digital, em que qualquer cidadão poderá participar da construção das políticas públicas (culturadigital.br/pna); seminários temáticos para aprofundamento de temas específicos; encontros setoriais; e uma “caravana das artes”, que percorrerá todos os estados do país, produzindo a mobilização necessária e assegurando que as singularidades territoriais do Brasil sejam levadas em conta no processo.

Não podemos nos contentar mais com ações pontuais e incrementais para nossa arte. É hora de encetar um grande processo estruturante: um presente para o futuro.

Francisco Bosco
Presidente da Funarte