Mais de 150 pessoas concentraram-se na tarde de quinta-feira, 17 de dezembro, em frente ao Teatro de Arena Eugênio Kusnet, num ato de repúdio à invasão policial e às agressões testemunhadas por integrantes do Núcleo Bartolomeu de Depoimentos, no saguão do prédio, há uma semana. Com música, poesia, trecho de espetáculo e depoimentos, os artistas lembraram a trajetória de resistência do Arena desde sua fundação.
Ocupado pelo Núcleo Bartolomeu em 2015, o teatro da Funarte era palco, no último dia 9, de uma aula pública com o DJ e ator Eugênio Lima, quando professor e alunos foram surpreendidos pela invasão de policiais motorizados à bilheteria, onde dois estudantes que vinham das manifestações contra o fechamento de escolas públicas de São Paulo, e, em razão da repressão policial, procuraram abrigo no espaço. Ironicamente, segundo Eugênio, a aula interrompida era sobre o movimento de autodefesa Black Panther Party, que mobilizou a população afrodescendente nos Estados Unidos, nos anos 70, contra a intolerância racial e a violência.
O ato desta quinta-feira reuniu protagonistas da luta de resistência travada pelo núcleo artístico do Arena durante a ditadura militar no Brasil, como Celso Frateschi, ex-presidente da Funarte, Cecília Boal e Dulce Muniz. Em depoimentos breves, os três atores lembraram episódios dos “anos de chumbo” que não podem ser esquecidos. Era naquele palco que eles estavam, por exemplo, quando souberam dos desaparecimentos dos artistas também ligados ao Arena Heleny Guariba (assassinada) e Augusto Boal (sequestrado pela ditadura militar).
“Este não é um fato isolado”, advertiu Celso Frateschi, com referência à ação violenta da polícia militar em São Paulo. Para o ator, a invasão ao Arena no último dia 9 tem, também, um viés simbólico: “O país depende dos artistas para que todos se entendam melhor. Talvez possamos nos engajar na marcha por este entendimento e na superação do momento em que vivemos”, propõe.
“É muito comovente falar aqui”, emocionou-se ainda a atriz, diretora e dramaturga Dulce Muniz. Dulce lembrou a presença de agentes da ditadura infiltrados no Arena nos anos de resistência, como na ocasião em que Celso Frateschi, Cecília Boal e ela encenavam a peça Doce América, Latino América (1971). “Este teatro é um templo, e como templo tem de ser respeitado”, defendeu.
“A Funarte repudia veementemente o ocorrido”, afirmou, por sua vez, Maria Marighella, coordenadora de Teatro do Centro de Artes Cênicas da Funarte, lembrando a posição da instituição, já publicada em carta de seu presidente, Francisco Bosco. A coordenadora reassegurou, aos artistas presentes, o compromisso da Funarte “com a memória, com a história e com o futuro livre.”
Cecília Boal lembrou, finalmente, que o Teatro de Arena “foi um núcleo fundamental não só de resistência, mas de todo o pensamento livre”.
O ato contou com a participação do presidente da Cooperativa Paulista de Teatro, Rudifran Pompeu, do ex-deputado estadual Adriano Diogo, do ator Paulo Goya, do representante do Ministério da Cultura em SãoPaulo, Gil Marçal, e do coordenador regional da Funarte em São Paulo, Tadeu de Souza, entre outros artistas e personalidades.