Funarte abre Mostra ‘Ponto transição’, reunindo múltiplas formas de arte

Thomas Jeferson - Objeto mídia 19. Foto: divulgação

Balançar o céu. Criar nuvens. Queimar fronteiras. Ajudar o vento a esculpir formas. E “botar o bloco na rua”. Essas foram algumas das primeiras experiências artísticas que o público pôde ter na abertura da exposição Ponto transição artes visuais, na Fundição Progresso, na Lapa – Rio de Janeiro, no dia 1º de setembro, quinta-feira. A mostra, que reúne trabalhos de 30 criadores e coletivos contemporâneos, utilizando diversas linguagens e tendências, faz parte da programação cultural dos Jogos Paralímpicos Rio 2016, realizada pela Fundação Nacional de Artes – Funarte/Ministério da Cultura. A entrada é franca.

Nesse primeiro dia, cerca de cem pessoas interagiram com as intervenções urbanas, poemas visuais, fotografia, trabalhos de audiovisual, videoinstalações, esculturas, objetos e outras formas de múltipla expressão; e participaram de performances – que continuam até o encerramento, dia 18 de setembro. A mostra ocupa os dois andares e também o mezanino e o terraço da Fundição – cercado pela vista dos Arcos da Lapa –. Estiveram presentes o Presidente da Funarte, Humberto Braga; o diretor do Centro de Artes Visuais da instituição Xico Chaves; o curador do Museu de Arte Moderna (MAM) – RJ, Fernando Cochiarale, servidor da Funarte; a diretora do Centro de Programas Integrados da entidade, Maristela Rangel; a assessora da Presidência, Ana Amélia Velloso; a coordenadora do CEAV/Funarte, Andréa Paes; e o servidor do Centro Ivan Pascarelli (responsável pela arquitetura da mostra); entre outras personalidades da arte, críticos, professores, estudantes, artistas e visitantes em geral.

Para atender a pessoas com deficiência visual, todas as obras da mostra tem descrições em braile. Ela conta, ainda, com o trabalho de mediadores.

Xico Chaves, Wlademir Dias Pino e Victor Arruda, diante da obra "Diagrama", de Ricardo Basbaum. Foto: divulgação

O artista Eduardo Coimbra, expôs uma obra com caixas luminosas, retratando nuvens, penduradas no teto da Fundição, que podem ser manipuladas pelos visitantes: o Balancéu. João Modé aproveitou o piso com desenhos geométricos, sobre os quais fez intervenções. A mostra reúne também projeções, como Anfipoemas (2016),– série de mil poemas visuais de Wlademir Dias-Pino e Regina Pouchain. Considerado um dos pioneiros desse gênero no Brasil, Wlademir, 89 anos (conhecido pela linguagem do “poema processo”), expõe desde 1939. “Em arte, tudo se funde – como na escrita oriental, em que o a imagem é ligada ao texto”, comenta ele. “O livro trouxe praticidade à escrita; mas a fragmentou. Antes, quem fazia o texto o ilustrava, o que dava coerência ao trabalho. Depois, a imagem ficou inferiorizada em relação ao texto […] Já hoje, já que o texto é ordinal e a imagem cardinal, esta cresceu e o discurso caducou. Ela caminha para o subliminar: afinal, onde começa e termina um quadro? A imagem entra e sai por muitos cantos e pode ser sobreposta. O discurso não porque nisso haveria ruído ”, acrescenta Wlademir. “A Funarte assume, com essa mostra, a busca de uma autêntica arte moderna brasileira. Porque o modernismo veio do exterior; e o que entrou de Brasil lá foi lendário. Fomos colonizados pelo discurso europeu, que não serve. Precisamos é criar, de agora em diante, um Brasil independente de qualquer outra cultura. E essa mostra é um ponto inicial de brasilidade – bandeira que a Funarte levantou aqui. E deve manter”, comemora o poeta visual.

A curadoria – uma reflexão sobre a arte contemporânea

Os artistas foram escolhidos a partir de um grande conjunto, dentre os que participaram de editais da instituição nos últimos 12 anos. Esses concursos permitiram uma catalogação ampla da produção nacional de artes visuais, que envolveu críticos de todo o país. As obras foram selecionadas pelos curadores artísticos do CEAV Luiza Interlenghi, Sonia Salcedo del Castillo e Xico Chaves. O diretor do Centro avalia que as artes visuais contemporâneas romperam com as fronteiras entre as linguagens. “E não há mais correntes definidas. Cada artista tem uma proposição própria, numa diversidade de individualidades e propostas – que podem não ser permanentes – . A arte saiu definitivamente de espaços fechados para a vida (sem negar conquistas anteriores, da pintura, da criação convencional). E não existe uma vanguarda, mas sim experimentação, em todos os níveis”, analisa o artista. Sobre a eclosão da performance nesse contexto, Xico defende que essa linguagem foi sempre incorporada à poesia e as artes visuais. “Quando ela começou a ser identificada, no início do século XX, representou uma ruptura com as formas de expressão convencionais. Na década de 50, foi denominada ‘happening’ – provando que a pintura saíra das molduras; e avançou para o real/imaginário. A partir dos anos 70 e 80, a performance passa definitivamente a ser parte da vida – uma interpretação dos modos de ver, utilizando o corpo como suporte. Hoje, se desdobra: incorpora a intervenção urbana; os coletivos e experimentos os mais variados. Passa a absorver grande parte da arte contemporânea”, conclui o diretor, – citando Hélio Oiticica: “O museu é o mundo” –.

Dissolvendo fronteiras entre as linguagens e limites da criação

Dentre as ações da abertura, estavam a performance de Chang Chi Chai. Sua obra Diáspora é um mapa-mundi no chão, no qual as divisas entre os países foram cobertas com rastilhos de pólvora; ela ateou fogo a eles, assim “queimando as fronteiras”, com ajuda dos visitantes, sob aplausos. Alex Hamburger fez sua instalação-performance Rádio do futuro.

Chang Chi Chai - "Diáspora": queimando fronteiras. Foto: divulgaçao

No terraço estão trabalhos como Laughing container, de Marcos Chaves (um contêiner de madeira, no qual risadas são ouvidas). Também ali se erguem as esculturas cinéticas Coxinha e mortadela, criadas por Raul Mourão especialmente para a mostra; e também Homenagem às vítimas do dinheiro, trabalho com neon, de Victor Arruda.

Várias mostras-relâmpago e performances são realizadas na Galeria Transparente. Com curadoria de Frederico Dalton, ela foi criada originalmente como um espaço virtual, onde vários outros artistas mostram seus trabalhos. Ali transposta para o mundo real, a instalação recebeu performances, em que o público interagiu. Uma exemplo foi Bloco minimalista, de Nivaldo Rodrigues Carneiro – na qual ele cria sobre um bloco geométrico; comenta sobre seu uso por outros artistas; e, no fim, sai com ele, para “botar o bloco na rua” (literalmente).

Conjunto variado de artistas de peso

Entre as próximas performances de Ponto transição agendadas estão: de Franklin Cassaro, Atos escultóricos (sábado, dia 10, às 17h); e dos Irmãos Guimarães, Respiração mais, (dia 17, às 19h). Muitos artistas fizeram obras especialmente para a exposição, como é o caso de Alex Hamburger, Alexandre Dacosta, Ana Muglia, Franklin Cassaro, Helena Trindade, Hugo Houayek, João Modé, Raul Mourão, Ricardo Basbaum, com João Camillo Penna, Thomas Jeferson, Coletivo Vade Retro Abacaxi, Valéria Costa Pinto, Victor Arruda e Wlademir Dias-Pino, com Regina Pouchain. Outros autores recriam, na mostra, trabalhos de sucesso, como: Ana Vitória Mussi, Armando Queiroz, Chang Chi Chai, Eduardo Coimbra, Elisa de Magalhães, Irmãos Guimarães, Marcio Zardo, Marcos Bonisson, Marcos Chaves, Martha Niklaus, Ricardo Aleixo, Ronald Duarte, Suzana Queiroga, Tchello d`Barros e Tina Velho.

A Galeria Transparente reúne ainda André Sheik, Angela Freiberger, Carlos Cesari, Clarisse Tarran, Coletivo S.T.A.R. (Adriana Tabalipa & Roderick Steel), Crioulos de Criação (Alexandre Sá, Amélia Sampaio e Tato Teixeira), Eduardo Mariz, Helena Wassersten, Lilian Amaral, Monica Barki, Rodrigo Munhoz e Tetsuo Takita.

O Presidente da Funarte, Humberto Braga, durante a performance "Nimbo Oxalá", de Ronald Duarte; e diante da obra "Laughing container", de Marcos Chaves

As curadoras artísticas Sonia Salcedo del Castillo e Luiza Interlenghi comentaram que uma ideia primordial da exposição é lidar com a transição entre as linguagens e criar atividades que geram pontos de ação e movimentação. “Isso fucionou muito bem aqui na Fundição Progresso. Cada trabalho criou uma atmosfera única para o público, em momentos lindos, como na performance Nimbo Oxalá, de Ronald Duarte – em que 20 pessoas, em círculo, com extintores de incêndio, produziram uma grande nuvem de espuma, numa espécie de ligação entre céu e terra –. Outra foi a do Franklin Cassaro (recentemente realizada na abertura das Olimpíadas do Rio), com suas esculturas infláveis em movimento – das mais pequeninas, às imensas – . Ele as manipula com vento, em ‘atos escultóricos’, em relação com o próprio corpo. E outras, em que o público pôde experimentar uma diversidade rica de conceitos; e brincar com a história da arte, em verdadeiras aulas, com humor”. Sonia e Luiza comentam que os criadores contemporâneos lidam com os desafios da vida atual, como as fronteiras do mundo globalizado; a violência e o vazio de uma experiência do sagrado, entre outros dilemas. “Esses artistas estão atentos a isso e, com a fala, o som, o corpo e os recursos mais diferentes, compartilham sua poética”, concluem.

Na quinta-feira, dia 8, os curadores artísticos falarão ao público, na sala Multiuso da Fundição.

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Ponto transição artes visuais

Exposição

De 1º a 18 de setembro de 2016, das 13h às 22h

Fundição Progresso
Térreo, 1º andar, mezanino e terraço
Rua dos Arcos, 24, Centro, Rio de Janeiro, RJ
Tel: (21) 32120800

Entrada gratuita

Realização: Luz Produções

Patrocínio: Fundação Nacional de Artes – Funarte/Ministério da Cultura
Apoio: Fundição Progresso

A programação da mostra é atualizada aqui, na rede social do realizador