A Funarte inaugura dia 5 de março de 2015, quinta-feira, às 19 horas, em São Paulo, a exposição Deslocamentos, do artista alemão radicado no Brasil Daniel Beerstecher. Contemplado pelo Prêmio Funarte de Arte Contemporânea 2014, Beerstecher terá sua instalação exibida ainda este ano, logo depois da temporada na Galeria Mario Schenberg da Funarte SP, em mostras individuais na galeria Kunsthalle Göppingen (Göppingen, Alemanha) e no museu de arte contemporânea Kunstmuseum Stuttgart (Stuttgart, Alemanha).
Instigado pela disseminação de televisores em bares e restaurantes nas cidades brasileiras por onde passou, e pela interferência desses aparelhos na socialização, o artista propõe uma instalação com mobiliário de boteco, onde projetará vídeos que ele mesmo produziu, nos últimos quatro anos, na América Latina, especialmente no Brasil. A exposição une territórios paralelos – como natureza e sociedade, ou instituição de arte e boteco – e dessa forma promove um deslocamento de suas funções e características originais. Cria-se, assim, um terceiro território, nascido da relação, que será ressignificado pelo público.
“Deslocar e deslocar-se é marcante na obra do artista. Daniel não só transita por diferentes realidades e cenários, como carrega consigo objetos que abandonam seus contextos originais, previsíveis, e ganham novas camadas de sentido”, diz a curadora da mostra, Flávia Mattar. “Eu trabalho muito com colagens, desde a fase de estudo para a criação de uma obra. Junto ambientes e objetos e assim crio uma nova imagem, um novo mundo. Não só as minhas foto-colagens, mas também os meus vídeos são colagens”, conta Beerstecher. O artista acumula, em seu currículo, participações em mostras individuais e coletivas em museus e galerias em Nova Iorque, Tóquio, Seul, Lisboa e Berlim.
The Conquest of the Useless (A Conquista do Inútil)
Entre as obras expostas está o vídeoThe Conquest of the Useless (A Conquista do Inútil) (2014), com 7 minutos de duração. Nele, Daniel veleja pela Ruta E40 e por pequenas ruas do sul da Patagônia argentina, em direção a Buenos Aires, em um barco adaptado com rodas e movido pela força dos ventos. O vídeo se distancia do aspecto documental e ativa a curiosidade do público diante de uma imagem que, no início, mais parece miragem. “A cena custa a se revelar e, quando o faz, é tão efêmera quanto absurda”.
Mas continua a vida…
O vídeo, com 5 minutos de duração, foi produzido em 2014 após a derrota do Brasil contra a Alemanha, na final da Copa do Mundo, e contrapõe duas realidades paralelas captadas
no mesmo momento: a velocidade do narrador contrasta com uma realidade aparentemente calma, suspensa, imóvel, formada por imagens do Parque Nacional de Itatiaia (RJ). O som intenso, pouco a pouco, vai abrindo espaço para os sons captados na natureza. Seria uma maneira de dizer, como o técnico da seleção brasileira Luiz Felipe Scolari, “… Mas continua a vida?”
Wie Ich Meinem Vogel Die Welt Erkläre (Como explicar esse mundo para o meu pássaro)
Atraído pela diversidade de territórios presentes no estado de São Paulo, Daniel mostra, neste vídeo de 2013, trechos de sua caminhada de quatro dias, num percurso de 90 quilômetros, com um pássaro em uma gaiola nas costas. A jornada tem início no centro histórico da capital paulista, passa por seu distrito financeiro, por condomínios fechados das classes altas, pela área industrial e por favelas, e vai deixando lentamente as áreas densamente povoadas para trás. A peregrinação o leva a uma comunidade indígena Guarani, que ainda vive uma vida tradicional na Mata Atlântica. No quarto dia, Daniel alcança seu destino final: a costa do Atlântico. O título do vídeo, que tem 13’56” de duração, é uma homenagem ao trabalho de Joseph Beuys How to explain the pictures to the dead hare (Como explicar desenhos a uma lebre morta), de 1965, e uma referência ao seu conceito expandido de arte (Erweiterter Kunstbegriff).
Churrasco
Neste vídeo de 15 minutos, concluído em 2010, o artista vaga pela Floresta Amazônica e, com uma bagagem especial nas costas, sube em uma árvore de 70 metros de altura. Aos poucos retira o que havia na mochila e itens inesperados surgem: churrasqueira, facão, bebidas e carne. Sentado em uma das mais altas árvores da floresta, ainda que em galhos frágeis, prepara o seu churrasco com carne de primeira qualidade, no meio da floresta. O trabalho apoia-se em um paradoxo: a possibilidade de manter árvores e altos índices de consumo de carne.
Diálogo com crítico Paulo Miyada
Além da exposição, acontece no dia 28 de março, às 15 horas, bate-papo entre Daniel Beerstecher e o crítico brasileiro Paulo Miyada, coordenador do núcleo de pesquisa e curadoria do Instituto Tomie Ohtake. Durante o encontro, que será realizado na instalação, os dois conversam sobre a importância do deslocamento de territórios, da imersão na natureza para a criação artística, traçando paralelos com a produção de outros artistas contemporâneos brasileiros. Na ocasião, haverá distribuição gratuita do livro Land-Sailor: A Conquista do Inútil para os presentes.
Livro Land-Sailor: A Conquista do Inútil
A trajetória de dois anos de produção do projeto Land-Sailor, que resultou na obra A Conquista do Inútil, será retratada em livro com lançamento previsto para 28 de março, às 15h. A publicação apresenta texto-diário, com ampla documentação fotográfica, em que o artista relata as situações pelas quais passou para concretizar a imagem de um veleiro adaptado com rodas fluindo com a força dos ventos na vastidão da Patagônia. A publicação tem, ainda, texto crítico de Raphael Fonseca. A aquisição e adaptação de dois veleiros, já que o primeiro, reformado na Alemanha, não pode ser transportado para a Argentina, está entre os relatos. Trata-se de um livro-experiência, como também é a produção artística de Daniel. O título baseia-se no livro A Conquista do Inútil, do cineasta alemão Werner Herzog, que relata a sua saga para fazer um barco escalar uma montanha no filme Fitzcarraldo (1982).
Prêmio Funarte de Arte Contemporânea 2014
Instalação: Deslocamentos, de Daniel Beerstecher
Abertura: 5 de março | Quinta, 19h
Visitação: De 6 de março a 18 de abril | Segunda a sexta, das 10h às 18h; sábados e domingos, das 15h às 21hs
Entrada franca | Recomendação etária: livre
Galeria Mario Schenberg do Complexo Cultural Funarte São Paulo. Alameda Nothmann, 1058, Campos Elíseos, São Paulo, SP. Tel (11) 3662 5177
Mais informações sobre Daniel Beerstecher: http://danielbeerstecher.com/