Seminário sobre Política Nacional das Artes aborda artes visuais, livro e leitura e música

Da esq. p. a dir.: Amilson Godoy e Cacá Machado (música); Mileide Flores e Sérgio Cohn (livro, leitura e literatura); Jaqueline Medeiros e Davy Alexandrisky (artes Visuais). Foto: S. Castellano

No dia 9 de junho, terça-feira, a partir das 14h30, o Ministério da Cultura e a Fundação Nacional de Artes – Funarte realizaram a segunda mesa do Seminário de Lançamento do Processo de Elaboração da Política Nacional das Artes (PNA), no Palácio Gustavo Capanema – sede dessas instituições no Rio de Janeiro. As exposições tiveram como tema os planos setoriais de artes visuais, livro e Leitura e música.

Compuseram a mesa representantes dos colegiados setoriais dessas linguagens artísticas – os grupos, que participam do Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC), são formados por representantes da sociedade civil e por técnicos. Artistas articuladores do debate nacional, ligados às várias áreas abordadas, também participaram do diálogo. A mesa antecedeu a de circo, dança e teatro, realizada a partir das 17h.

Pelo Colegiado Setorial de Música, falaram Amilson Godoy (representante da área de música clássica) e Val Macambira (música popular). A fala do Colegiado Setorial do Livro, Leitura e Literatura ficou a cargo de Mileide Flores. O Colegiado Setorial de Artes Visuais foi representado por Davy Alexandrisky. Os articuladores presentes foram Cacá Machado (música), Sérgio Cohn (literatura) e Jaqueline Medeiros (artes visuais). A mesa teve a mediação de Eulícia Esteves, servidora da Coordenação de Música Popular da Funarte. Estavam na plateia o presidente da Funarte, Francisco Bosco, entre outros diretores e coordenadores dos vários setores da Casa; bem como autoridades do Ministério da Cultura; representantes dos diversos colegiados setoriais; e artistas, em geral.

Logo após o término dos debates, foi realizada a performance artística Abrigo Mar, de Franklin Cassaro, com Vanessa Arruda; e uma mostra de videoarte, com obras de Rogério Nunes, Berna Reale, Coletivo À Deriva e do projeto Bola na Rede (Funarte).

Eulícia Ribeiro abriu a mesa. “Nosso ponto de partida são os planos setoriais das artes, que apontam diretrizes para a Política Nacional. Mas precisamos refletir sobre esses documentos, até porque eles foram produzidos em outro momento histórico”, comentou a servidora da Funarte. “Estamos felizes porque as pessoas atenderam ao convite de nos ajudar a construir essa política de uma forma democrática”.

Livro, leitura, literatura e bibliotecas

A Diretora Vice-Presidente da Associação Nacional de Livrarias, livreira e agitadora cultural Mileide flores destacou que representava a fala coletiva do Colegiado Setorial do Livro, Leitura e Literatura – 2012/2014. Dizendo que o grupo acrescentou o tema “bibliotecas” às pautas, a livreira parabenizou a Funarte e o MinC pelo debate e afirmou: “Os planos setoriais de cultura são apresentados hoje como apenas um acúmulo de ideias e sugestões, sem durabilidade e consistência para uma política de estado. Discordamos disso”. Segundo Mileide, o debate nacional para a construção do Plano Nacional de Livro e Leitura (PNLL) teve ampla participação da sociedade civil; e prosseguiu, em todas as macrorregiões do Brasil, com videoconferências regionais e uma nacional, reunindo todos os estados brasileiros e o Distrito Federal, com interação com o público e acompanhamento de observadores internacionais – além de 97 encontros, entre outros eventos. “Houve ampla participação de movimentos sociais”, complementou a livreira. Ela acrescentou que o PNLL foi pautado a partir das ideias de vinculação entre estado e sociedade e entre cultura e educação e que uma subsecretaria do MinC, a atual diretoria de LivroLeitura,Literatura e Bibliotecas (DLLLB) da Secretaria Executiva do Ministério, foi criada a partir do movimento de valorização desta área, iniciado com o Colegiado (então Câmara Setorial).

A palestrante lembrou que o Plano Nacional de Livro e Leitura (oficializado em 2011), cujo projeto de lei está na Casa Civil da Presidência da República, para seguir ao Congresso, carece de decisão política e maior articulação para ser aprovado. Mileide comentou que o PNLL tem a democratização da leitura e o desenvolvimento de bibliotecas e da produção do livro como importantes elementos constitutivos; e resumiu os diversos eixos de ação do Plano. A palestrante expôs algumas demandas, tais como necessidade de programas de bolsas para escritores e editais federais para clubes de leitura, entre outras.Também destacou a necessidade de se consolidar o debate sobre a proteção do direito autoral e a adaptação de obras; e, ainda, de que sejam criadas políticas de incentivo ao escritor. “Programas como editais e bolsas são fundamentais para os criadores. É preciso estimular a formação de escritores e consolidar uma política de estado para leitura”, defendeu.

Artes visuais

O fotógrafo, fotojornalista e militante cultural Davy Alexandrisky, do Colegiado Setorial de Artes Visuais destacou que o plano setorial de sua área foi o primeiro documento gerado no CNPC; e que o Colegiado teve uma recente renovação de 75%. “Quando recebemos a tarefa de fazer uma ‘revisão’ do plano, tivemos reações dentro do Colegiado. Alguns questionaram como se revisaria algo que nunca fora posto em prática. Mas discutimos item por item do documento e entregamos para a sistematização do MinC. Mas agora fomos chamados a esse debate”, relatou Davy. “Já começamos e recomeçamos esse diálogo várias vezes. Mesmo assim, agora, me situo nesse recomeço do Ministério e da Funarte com o entusiasmo e o empenho de uma primeira vez. Fico feliz porque as áreas terão interlocutores, o que vai favorecer a conversa e o equacionamento do processo de aconselhamento ao Ministério. Afinal, se somos ‘conselheiros’ temos que fazer isso a partir de uma referência, que represente um coletivo”, acrescentou.

Davy destacou que o Colegiado de Artes Visuais foi dividido em funções, como mediação, regionalidade, produção e contato com os artistas. “Quanto a este último, ele ainda não foi feito de forma substantiva”, destacou. Disse ainda que o Colegiado atua em três eixos básicos: formação, legislação e articulação – sendo este último relacionado ao diálogo com o Ministério e com os outros colegiados. “A forma de produção das artes visuais tende a ser individual, o que não favorece a formação e a manutenção de grupos”, apontou. “Colocamos ‘sementes’ de propostas na internet, mas percebemos que faltava planejamento sistemático. Sempre se encontrou essa dificuldade. No geral, não há essa cultura de sistematização. Por outro lado, mesmo na crise de representatividade atual; mesmo que não representemos nossos setores com perfeição, é possível fazer alguma coisa, contribuir”. Davy acrescentou que, dentro deste esforço, as pessoas não devem se transformar em “tarefeiras” somente, mas ser planejadoras.

Música

O maestro e pianista Amilson Godoy, do Colegiado Setorial de Música, declarou-se representante também de outras entidades: os fóruns Paulista e Nacional de Música. “Trago aqui a esperança surgida há 11 anos, quando o então Ministro Gilberto Gil acenou uma bandeira de ‘redenção’ do Estado Brasileiro para a atividade cultural”. Essa relação “caminhava, até então, a passos de tartaruga”, avaliou. “Tivemos sucesso em algumas coisas. Mas o sentimento de frustração dos envolvidos no processo é muito maior. Naquela época, propusemos a nacionalização dos fóruns de música – até então restritos a S. Paulo e Rio de Janeiro”. O maestro relatou que a antiga Câmara Setorial de Música teve, na ocasião, pouco mais de um mês para buscar uma representatividade nacional dos músicos. “Saímos, por conta própria pelo país e conseguimos reunir 13 estados, começando o maior levantamento da realidade musical brasileira, no Fórum Nacional de Música, com a colaboração fundamental da então diretora do Centro da Música da Funarte, Ana de Hollanda. Em um ano, atingimos todo o Brasil e construímos o Plano Nacional de Música”.

Amilson relembrou a importância do Fórum Nacional para reivindicar a defesa dos direitos autorais dos músicos. Reconheceu nominalmente a colaboração de dezenas de pessoas que participaram do colegiado setorial e dos fóruns estaduais, das áreas produtiva, artística, educacional e técnica, entre outras. “Organizamos nacionalmente a categoria, num movimento suprapartidário, contribuindo com o Estado para a construção de uma política, no Plano Nacional de Música, realizado com consulta pública na internet, agora em fase de sistematização”. O músico lembrou que também foram planejados, por um grupo voluntário de vários maestros, programas de ensino musical nos CEU’s das Artes, com o aproveitamento de projetos de sucesso no Brasil e em outros países da América do Sul. “Ainda estamos à espera de resultados em relação a isso”, disse o regente. “Do que não precisamos é de palavras, caravanas e novos planos. Do que precisamos é de recursos financeiros e estruturais injetados na atividade-fim, ou seja: medidas práticas de fomento e ampliação do campo de trabalho para os artistas”. Segundo Amilson, as artes nunca estiveram tão abandonadas, e seus aparelhos tão sucateados. Ele disse que sua categoria reivindica uma agência da música. Para ele, a cultura artística ficou relegada a segundo plano, pelo fato de a visão de “viés antropológico” de agentes públicos superar a abordagem com foco na arte. “Mas foram as artes que projetaram o Brasil no mundo. E foram os artistas que lutaram pela criação do Ministério da Cultura. E reformas legais estão sendo propostas, que omitem a arte dos seus propósitos. Mas nós, músicos, aprendemos a sobreviver com os governos, sem eles, e apesar deles. Queremos contribuir com esse novo tempo que se anuncia, com nosso novo Ministro Juca Ferreira e sua equipe, na esperança que ‘o trem volte aos trilhos’ ”, concluiu.

O cantor e compositor Val Macambira (música popular) começou sua fala com a pergunta: “existe cultura sem educação?”. Para o artista, é preciso que se faça uma mudança de projeto da política cultural como um todo, nesse sentido. “O CNPC precisa passar por uma reforma total. Os conselheiros não têm autonomia”, argumentou, dizendo que os músicos não foram atendidos em sua solicitação de um seminário sobre o setor (no qual se discutiria, por exemplo, a proposta de criação de uma entidade governamental específica para a música). Sendo delegado regional do Nordeste do CNPC, Macambira deu destaque, ainda, ao fato de que, nunca foi convocada uma reunião com os delegados regionais. Para ele, falta respaldo aos conselhos regionais, para que estes tenham força junto a, por exemplo, autoridades estaduais.

Com a palavra os articuladores

O escritor e editor Sérgio Cohn declarou: “As questões do livro e leitura vão desde a memória até a reflexão crítica, passando pela criação em ambientes de crise. Hoje é o início de um processo de conversas, para fortalecimento que nos leve a uma efetividade. Estamos construindo juntos esse diálogo. Temos que começar aqui um processo, que deve ser conduzido também com leveza e alegria”. A coordenadora de Artes Visuais do Centro Cultural Banco do Nordeste (Fortaleza – CE), Jaqueline Medeiros, mestre em História e Crítica de Arte (UERJ) e doutoranda na área, considerou que praticamente todos os assuntos sobre os temas do debate já foram discutidos nos planos setoriais das artes, e que o momento é de definir prioridades – decidir o que desenvolver. “O desafio foi conhecer a última versão dos planos setoriais e definir por onde começar, mas continuar a interlocução, a escuta a instituições e pessoas, ligadas a memória, acervo e demais áreas. É também momento de desenvolver as relações entre as linguagens artísticas. Cada um aqui representa um segmento, mas sabe que essas fronteiras não são tão rígidas”. O compositor, cantor, instrumentista e historiador Cacá Machado lembrou que o Fórum Nacional da Música foi o grande dínamo da Câmara Setorial de Música, antes de elas se transformarem em colegiados. “A Feira Música Brasil [2009 e 2010] foi importante nesse processo de discussão. Houve um hiato de aproximadamente quatro anos. Agora, é preciso sistematizar o material produzido e fazer ajustes finos nele. É preciso, em primeiro lugar, compreender todo esse processo de discussão e aceitá-lo, como apenas o começo. Virá muito mais”, avaliou Cacá.

A mesa seguinte, realizada a partir das 17h, teve como temas circo, dança e teatro.

Intervencao "Abrigo mar", de Franklin Cassaro (esq.), com Vanessa Arruda. Foto: S. Castellano

Sobre a Política Nacional das Artes

O objetivo da Política Nacional das Artes (PNA) é consolidar e implementar um conjunto de políticas públicas capazes de fortalecer as cadeias produtivas e o valor das artes, além do seu valor simbólico. A PNA será construída a partir do diálogo com a sociedade e da valorização da arte e da cultura em suas múltiplas possibilidades, através de diretrizes e mecanismos que possibilitem o fomento, a preservação e o desenvolvimento das diversas linguagens artísticas. Para alcançar essas metas, a Funarte pretende que o debate mobilize artistas, gestores, produtores e todos os segmentos envolvidos com as artes.

Na cerimônia de abertura do Seminário, o MinC lançou a plataforma digital http://culturadigital.br/pna, em que os interessados podem comentar e dar sugestões para cada um dos pontos já discutidos nos planos setoriais das artes, além de uma enquete. Os debates prosseguem, ainda, em caravanas por diversos locais do país e em seminários temáticos. O processo de discussão da PNA, segundo o Ministro da Cultura, Juca Ferreira, vai resultar na revitalização da Funarte.