Circo, dança e teatro encerram Seminário sobre a Política Nacional das Artes

O debate sobre os Planos Setoriais de Circo, Dança e Teatro foi aberto pelo diretor de Artes Cênicas da Fundação Nacional de Artes – Funarte, Leonardo Lessa. O tema, o segundo abordado na tarde de terça-feira, 9 de junho, teve como expositores Bia Mattar (Colegiado Setorial de Dança/SC), Flavio Toriccelli (Colegiado Setorial de Circo/SC), Márcio Silveira (Grupo Manjericão – Teatro de Rua/RS), Rui Moreira (Dança), Junior Perin (Circo Crescer e Viver) e Marcelo de Bonis (Teatro). A mesa de debates foi a última do Seminário sobre Política Nacional das Artes, organizado pelo Ministério da Cultura e Funarte, para reunir propostas para as áreas de música, artes visuais, artes cênicas, livro e leitura, que possam contribuir para as ações do MinC para 2016. O evento foi aberto pela manhã, pelo ministro da Cultura, Juca Ferreira, com a participação do presidente da Funarte, Francisco Bosco e a presença de autoridades da área cultural.

Dança
O incentivo à formação do profissional de dança, a partir da criação de novos cursos superiores – um em cada estado – e de escolas técnicas e tecnológicas públicas foi um dos aspectos abordados por Bia Mattar. Ela destacou também a importância da educação informal fornecida pelas academias e cursos livres de dança, que contribuem para a qualificação dos artistas que mais tarde irão buscar sua formação acadêmica na dança. Falando sobre a cadeia produtiva do segmento, Bia enumerou a criação de emcubadoras artísticas voltadas à pesquisa, criação e difusão com apoio técnico administrativo que auxilie na circulação de espetáculos;  e o fortalecimento das políticas públicas de editais e programas de bolsa de pesquisa, intercâmbio, montagem e circulação de espetácilos como aspectos importantes e que devem ser mantidos na elaboração do Plano Setorial da Dança.

A debatedora falou também da importância do mapeamento da dança, que deve ser realizado Brasil afora, por meio de articulação entre os ministérios da Cultura e da Educação. No ítem dos editais, Bia assinalou que a formulação dos concursos deve levar em conta a diversidade regional e de gêneros. Quanto à profissionalização, ela ressaltou a necessidade de rever a legislação trabalhista, além da criação de novas leis para o setor que respeitem as funções dos profissionais da dança.  Enfatizou que deve haver mais diálogo entre os gestores das diversas esferas de governo para a elaboração das políticas públicas. “Muitas vezes o gestor lê o plano e interpreta da maneira dele e não da maneira que a gente vêm discutindo.” Ela expôs, ainda, a falta de manutenção e disponibilidade de equipamentos públicos – “muito teatro vazio, fechado e sucateado”; a necessidade de subsídio  para ingressos e de um cronograma definido para programas e editais. Bia Mattar destacou o Prêmio Funarte de Dança Klauss Vianna como um dos mais importantes do segmento e que, por isso mesmo, deve receber mais investimento. “Assim, como a gente deseja a Funarte mais forte como um todo porque ela nos representa”, afirmou. Finalizou lembrando que um dos maiores anseios da área é a criação de legislação efetiva que atenda aos profissionais da dança e suas especificidades, e aproveitou para criticar a manutenção da Lei 8.666. “Não dá mais pra gente usar essa lei em nossos editais e em nossa prestação de contas, vamos fazer uma revisão do sistema tributário para as atividades artísticas”.

Circo
Representando o Colegiado Setorial de Circo, Flávio Toriccelli explicou porque o segmento vem se recusando a revisar e atualizar as diretrizes do Plano Setorial de Circo, apesar dos pedidos do MinC para esta tarefa desde 2010. “O Circo solicitou ao ministério que apresentasse o que dentro do Plano Setorial de Circo tinha sido implantado e nunca foi dada essa resposta. Na época, o Plano era muito consistente, muito amplo, pois trazia todos os anseios e necessidades dos circenses – difusão, criação, formação, mapeamento do circo em todo o Brasil, fomento, legislação – existem várias leis no Congresso, mas que ficam lá paradas.” Flávio lembrou que está em curso o período de renovação dos colegiados. Ele expôs sua apreensão com esse processo eleitoral, diante das dificuldades dessa renovação, como o cronograma, que, segundo ele, é um “processo atropelado”, pois tem que ser concluído até outubro. “É um processo muito importante, e, o último já foi atropelado; tem vários colegiados que não têm o número suficiente de titulares, que dirá de suplentes.” Ele propôs que esse prazo seja estendido. Disse também que o curto tempo para a eleição se refletirá na elaboração dos planos setoriais e que o circo vem sofrendo por causa do último processo, já que não teve tempo para fazer a sua revisão.

Flávio também abordou as dificuldades que os artistas encontram em discutir o papel das artes dentro do Conselho Nacional de Política Cultural. “No ano de 2014 não foi discutido absolutamente nada em relação às artes, que foram postas de lado por conta de discussões antropológicas que são importantes, em relação às culturas afrobrasileiras e indígenas.” Ele destacou a importância do encontro de Política Nacional para as Artes, e disse que, neste ano, já é o terceiro de que participa, convocado pelo governo. “Temos que aproveitar esse momento para discutir bastante essa relação das artes dentro do CNPC, sua importância e dos colegiados. São os colegiados que constroem os planos setoriais que vão nortear a Política Nacional das Artes.

Teatro
Márcio Silveira, artista de rua e representante do Rio Grande do Sul e que integrou o Colegiado de Teatro por dois mandatos, começou sua explanação criticando o pouco avanço conquistado sempre depois de muita discussão, o que se repete na área de teatro, tal qual é visto na dança e no circo, como foi exposto anteriormente pelos representantes dessas linguagens artísticas. “E não é muito diferente com o teatro. E quando é feita uma desmobilização do CNPC, a gente fica com o pé atrás. Há um processo histórico que não pode ser negado”, lembrou. Márcio explicou sobre o Plano Setorial de Teatro, publicado em 2010 e revisado em 2014, mas que já se encontra defasado de novo. Ele falou sobre as conquistas, como a criaçao do edital Prêmio Funarte Artes na Rua que contempla as três linguagens de artes cênicas, e do reconhecimento do teatro de Mamulengos, como patrimônio cultural brasileiro. Uma questão levantada por ele diz respeito à falta de equipamentos técnicos que leva ao fechamento de teatros – e citou dois fechados, e também a precariedade de equipamentos como praças, que servem ao teatro de rua. Isso levou a que, na revisão do Plano Setorial de Teatro, fosse incluída a necessidade de criação e manutenção de praças e parques ou outros equipamentos culturais que venham a contemplar as artes de rua. “Muitas vezes os arquitetos e urbanistas fazem os projetos e não há espaço nenhum para o artista, porque o artista não é bem vindo no espaço público.” Márcio Silveira informou que, dentro das propostas para a área, está a criação do Prêmio de Teatro Brasileiro.

Articulador da área de circo, Junior Perin, do Circo Viver e Crescer (RJ), abordou o aspecto econômico do fazer artístico . Ele falou que é preciso debater a formalização da arte, que ainda está calcada numa legislação ultrapassada que não leva em conta a sazonalidade da produção artística. “É preciso rever um conjunto de marcos regulatórios que danificam e complicam  e dificultam o desenvolvimento das artes no Brasil . É preciso que os artistas, os realizadores se interessem por esse campo. O artista não se percebe como sujeito produtivo. A arte é pra ser pensada como uma nova estratégia de desenvolvimento brasileiro.” Ele disse discordar do pensamento que todo artista tem, desde os anos 70, em se tornar profissional, pois, através do código brasileiro de ocupações, se submete a uma legislação trabalhista ultrapassada, originada em modelo do século passado, que não contempla a sazonalidade da produção artística, criativa e cultural. “A classe artística deve fazer a sua parte, sobretudo se percebendo como atividade produtiva, porque do contrário não terá o interesse nem do capital nem do governo. Tem que haver coragem de se assumir nesse lugar. Tem que disputar essa agenda econômica do desenvolvimento brasileiro.”

Críticas e sugestões no debate
Um dos articuladores, Edézio Paz, editor do Jornal da Dança, criticou como o mapeamento de dança vem sendo feito. Na avaliação de Edézio, o mapeamento deveria ser realizado pelo Estado, “que se acomodou na ausência de uma política de Estado”.

Marinez Fernandez, de Volta Redonda (RJ), que já integrou o Colegiado de Teatro, e disse desenvolver seu trabalho em oito municípios do norte fluminense com patrocínio de empresas privadas, fez críticas aos editais da Funarte. “Nunca ganhei nenhum edital da Funarte e, por isso,  comecei a estudar os editais, a cruzar as informações – probabilidade e porcentagem. Quando se tira probabilidade e porcentagem, veja quantos vivem dos editais na capital, na cidade do Rio de Janeiro. Cruzem os nomes e vão ver quem se dá bem com esses editais. Há muito tempo não participo.  E quero que vocês pensem em uma forma democrática, façam uma análise. Vamos dar ‘mais mole’ pra quem mora longe.”

Reinaldo Santana, gestor e articulador do Visão Suburbana, também do Rio, abordou a situação do teatro comunitário em comunidade, que sobrevive nos subúrbios cariocas, onde há ausência de equipamentos culturais, e no interior, sendo o único vínculo com as artes cênicas.  Ele disse que essa modalidade artística também está nos quilombos, nas aldeias indígenas,  que também não são representadas no processo de gestão, e na população de cárcere.  “O Rio de Janeiro já tem 30 grupos de teatro comunitário e queremos discutir com o Setorial de Teatro uma política para esse teatro,  pois não é contemplado nem nos editais. Também não tem DRT e por isso, alguns teatros não nos autorizam representar.”

Articuladores ainda assinalaram a ausência de representantes de outras regiões brasileiras e problemas da conjuntura econômica que vêm motivando a extinção de secretarias de cultura em alguns municípios.

Após os debates, que foram acompanhados pelo presidente da Funarte, Francisco Bosco, os participantes puderam assistir à performance teatral Onde? Ação nº 2, com a Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Travez, no pátio externo do Palácio Gustavo Capanema, que também instigou a curiosidade de pessoas que transitavam pelo local, depois do trabalho. Um show do rapper Emicida, no Circo Voador, na Lapa, também marcou o encerramento  do encontro.

O Seminário sobre a Política Nacional para as Artes dispõe da plataforma digital http://culturadigital.br/pna, em que os interessados podem comentar e dar sugestões para cada um dos pontos já discutidos nos planos setoriais das artes, além de uma enquete. Os debates irão prosseguir em caravanas por diversos locais do país e em seminários temáticos.

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